"[...]mas faz-nos esboçar uma realidade supra-sensível compatível com o uso experimental da nossa razão. Sem uma tal precaução, não saberíamos fazer o mínimo uso de semelhante conceito e deliraríamos ao invés de pensarmos.[...]"

16
Dez 08

Aperceber-se, na escuridão do presente, desta luz que procura alcançar-nos e que não o pode fazer, eis o que significa ser contemporâneo. Por isso é que os contemporâneos são raros. E por isso é que ser contemporâneo é, antes de mais, uma questão de coragem: porque significa ser capaz não apenas de ter o olhar fixo na escuridão da época, mas também aperceber-se, nessa escuridão, de uma luz que, dirigida na nossa direcção, se distancia infinitamente de nós. Ou ainda: ser pontual ao encontro a que se pode somente faltar.

 

Um encontro falhado ao qual se é pontual, obstinada e obsessivamente, é, nas palavras de Agamben (aqui numa tradução do sempre atento André Dias) o trabalho do contemporâneo; ao limite, o trabalho da contemporaneidade, dela e por ela. Sirva isto para alumiar as obras artísticas que assumem esta "coragem" (e, por contiguidade, será esta "coragem" toda a questão crítica - no elevado sentido kantiano - da exposição das ditas). Assim sendo, e concordando que será de evitar sempre uma escolha directa e oficial, por parte do Estado, também o será toda a gama de organizadores e curadores que mais não seguem senão as directrizes das feiras internacionais servindo anseios galerísticos (com honrosas excepções que as há). Da "coragem" da obra à exigência crítica de quem a promove vai um passo decisivo. E é para mim sintomático que das pessoas que mais profundamente pensam a Arte no nosso país não se lhes conheçam muitos convites para projectos de curadoria. Portanto, entre uma escolha de "qualidade reconhecida" que venha contribuir para a "paródia" e um feliz acidente de uma escolha directa, acho que não preciso de escolher. Talvez para 2011 possamos ter como curador alguém como Maria Filomena Molder.

 


10
Nov 08

De resto, toda a investigação em ciências humanas – e portanto também a presente reflexão sobre o método – deveria implicar uma cautela arqueológica, ou seja, regredir no próprio percurso até ao ponto em que algo permaneceu obscuro e não tematizado. Só um pensamento que não esconde o próprio não-dito, mas incessantemente o retoma e o desdobra pode, eventualmente, ter pretensão à originalidade.

 

Agamben, Giorgio. «Avvertenza», Signatura rerum. Sul metodo, Bollati Boringhieri, Torino, 2008, pp. 7-8. Retirado e (imagino) traduzido (d)aqui, porque o meu ainda não chegou.

 

 

escrito por José Carlos Cardoso às 23:17

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