Não sabemos ainda em propriedade o que é a contemporaneidade. Sabemos que não é, simplesmente, o actual-presente, em confronto com o qual Benjamim criou o conceito de Jetztzeit a partir do Angelus novus de Klee, e que implicava uma inflexão política e epistemológica do historicismo dominante. Poucos anos antes Heidegger batia-se contra aquilo que qualificou como o "conceito vulgar de tempo". Interessa, pois, nestes momentos históricos em que se vislumbra o novo no horizonte - se realidade ou ilusão, é uma questão infértil com categorias obsoletas, atente-se aqui a uma imagem específica produzida pelo seu tempo, e à pre-disposição dos corpos contemporâneos a esta (no sentido em que são, simultaneamente, causa e efeito) para a encarnar - compreender as duas faces do tempo desse surgimento, os dois tipos de movimento. Se, por um lado, temos essa faceta mitológica do presente devorador, aterrador, negativo (em sentido ontológico), que análises avisadas como a de Sloterdijk tomam como único e infinito (querendo ultrapassar o "total" de Jünger), temos também toda uma outra gama de linhas desse movimento que descolam do empírico negativado e que constituem a possibilidade mesma de surgimento do novo. Assim sendo, o contemporâneo adquire uma dimensão própria que ambiciona ao plano transcendental, um tempo já não de facto, mas de juris, que traz o novo ao/do presente. Aquilo que está virtualmente em mudança só pode, pois, ser pensável neste plano, sendo que qualquer passo em falso no sentido de uma "confusão" deste em relação ao actual-presente pode conduzir a "cegueiras" do género das que padeceram o próprio Heidegger (em relação ao nazismo) e Sartre (com o estalinismo), para dar só dois exemplos.
A imagem acima é da capa do The Economist.